E agora, de quem é a culpa?

Bruno Sulzbach
4 min readMar 18, 2021

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UTI lotada no Hospital de Clínicas, de Porto Alegre. — Foto: Silvio Avila/Divulgação

Está desabando uma torre do World Trade Center por dia no Brasil. Pessoas estão morrendo em filas de hospitais, em UTIs, em casa e, enquanto isso, os comerciantes desesperados após um ano de perdas financeiras estão indignados com os fechamentos nas cidades ou estados em que os governantes decidem aplicar medidas mais restritivas, semelhantes ao “lockdown”.

E agora, José? Após um ano do início da pandemia, de quem é a culpa?

Essa é uma pergunta com várias respostas.

Não é o meu intuito fazer um juízo de valor de quem apoia ou não medidas drásticas de restrição e isolamento, mas fazer-nos refletir sobre o que poderia ter sido feito de maneira diferente. Afinal de contas, é improvável que esse seja o último desafio epidemiológico da nossa geração.

Primeiramente, a epidemia global pela qual estamos passando — ao mesmo tempo que apresenta diversas dificuldades para os países, principalmente os menos desenvolvidos — possibilita uma melhor chance de acertar a resposta no combate ao vírus. E a explicação está na frase anterior. A epidemia é global.

Poucas vezes um país tem a chance de enfrentar um problema ao mesmo tempo que o resto do mundo todo. Ou seja, para reagir bem ao problema, não há necessidade de ser um gênio ou ter uma bola de cristal. Basta observar as condutas que surtem mais efeitos em outros países e estudar como promove-las de acordo com a realidade da infraestrutura do país.

No caso do Brasil, nenhuma das medidas “exemplo” traria grandes dificuldades logísticas de adaptação à nossa realidade. A partir do 3° mês ficou muito claro a receita para a guerra:

  1. Promover medidas de restrição e distanciamento social, ainda que não tão restritas quanto um lockdown total;
  2. Promover o uso de equipamentos de segurança (máscaras, principalmente), medidas de higienização e de inspeção;
  3. Assim que possível, assinar acordos com fabricantes de vacinas (no mínimo 3 fabricantes, já que na época não se sabia se todas teriam sucesso no desenvolvimento);
  4. Vacinar assim que possível uma parcela grande da população para que:

a. Se diminua os riscos de novas mutações mais perigosas e;

b. A economia possa se recuperar o quanto antes.

Ao invés disso, tivemos um líder que incentivou grandes aglomerações, não deu o exemplo utilizando equipamentos de proteção e nem promoveu o uso, não somente não assinou acordos com fabricantes de vacina como se posicionou contra a vacinação em diversas ocasiões, por consequência não pode vacinar uma grande parcela da população em pouco tempo e, inevitavelmente, enquanto a economia engatinhava uma recuperação, temos novamente que impor medidas de restrição para conter o contágio localmente.

Muitos argumentam contra algumas das medidas citadas acima, justificando que o Brasil não teria condições fiscais de arcar com os acordos preliminares de vacinas ou auxílios durante medidas restritivas. Pois bem, que o Brasil vive uma situação caótica nas contas públicas não é novidade, porém esse argumento não se sustenta pelo simples fato de que o dano gerado pela inação, seja perante aos auxílios à empresas e trabalhadores, seja perante a vacina, é muito maior.

Os auxílios permitem uma navegação menos turbulenta diante do tempo em que o país precise impor medidas restritivas, o que promove uma recuperação muito mais acelerada quando as mesmas poderem ser encerradas.

Por outro lado, os acordos com as fabricantes de vacinas e a consequente vacinação em massa fazem com que esses auxílios sejam mais curtos e que a recuperação possa iniciar antes.

Ou seja, a segunda medida não só diminuiria a necessidade de maiores gastos com a primeira como faria com que o governo voltasse a arrecadar mais, antes, através de tributos pagos pelas empresas que estariam agora vendendo mais e consumidores que estariam agora comprando mais.

Não é difícil de se entender.

Mas então, de quem é a culpa?

Parte dela foi explicada acima. A outra parte fica limitada à regionalidade das ações tomadas por governadores, prefeitos e os cidadãos dessas comunidades.

Hoje muitos dos comerciantes no Rio Grande do Sul tem que fechar suas portas. O sistema de saúde do estado não consegue mais suportar a quantidade de doentes, mortos. Porém, há um mês, enquanto milhares de pessoas se reuniam nas praias de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, os estados não agiram para conter essas aglomerações. Assim como muitas das pessoas lá aglomeradas eram comerciantes, ou filhos dos mesmos, e poderiam ter pensado no futuro de seus negócios e seus familiares antes de escolher como passar o carnaval ou as suas férias. Muitos que hoje estão indignados com a situação da saúde ou do fechamento de comércio no estado pouco fizeram para conter a pandemia. Não deram o exemplo, não cumpriram seu papel, não fizeram a sua parte.

Concluindo, a situação atual fortalece o antigo ditado de que o povo tem o governo que merece. Apesar de ser uma super simplificação da situação atual, cai bem.

Estão todos errados. Todos nós. Governos, comerciantes, trabalhadores. A imensa maioria poderia ter agido muito diferente. Uns em um grau menor, outros em um grau maior. Mas não há santo na situação que estamos tendo que enfrentar hoje.

Precisamos refletir, pois a próxima pandemia pode não dar muitas chances para nosso aprendizado.

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Bruno Sulzbach
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Written by Bruno Sulzbach

I will write opinions and reflections about politics, economics, and philosophy. PTBR & ENG.

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