Sobre o Progresso: Uma Pílula de Otimismo em Tempos de Caos

Bruno Sulzbach
6 min readJul 20, 2020

--

A tecnologia recente — computadores, internet e até mesmo a TV — virou o mundo do avesso, principalmente quando se trata da nossa relação com a informação. Ela se tornou mais acessível, porém notícias falsas são mais volumosas que em outros tempos. Ela também se tornou mais dinâmica, talhada para diferentes públicos, conforme o interesse do divulgador, o que pode contribuir para a polarização e diminuir a diversificação dos diversos debates do nosso dia a dia. Nós tomamos como certas algumas conclusões sobre perguntas que não conhecíamos uma hora atrás.

Esse bombardeamento de informação pode ser proveitoso para quem souber navegar com cautela entre os diversos propagadores e veículos de comunicação. Contudo, nem o piloto mais experiente pode se desviar de todas as adversidades e mentiras às quais está sujeito. As possíveis consequências dessa hiper democratização da (des)informação são muitas. No primeiro parágrafo mencionei a mais evidente nesse momento: a polarização. Porém, para quem observa a arena de combate entre ideias, presunções, mentiras, verdades e opiniões, seja pertencendo à um grupo radical ou assistindo os fatos de cima, o que pode ocorrer é um certo desânimo, um esvaziamento na esperança de ver o mundo progredir, de entregar para gerações futuras uma sociedade mais educada, sóbria, pacifista e ponderada.

A “briga boa”, a discussão amistosa entre progressistas e conservadores, parece estar cada vez menos sob os holofotes, enquanto o conflito entre as duas pontas da ferradura ideológica parece dominar todos os assuntos. Quem está em uma ponta, teme que o outro lado “vença” tanto quanto teme a morte. Quem está no meio lamenta que qualquer um dos extremos sequer exista.

Acabamos esquecendo o progresso que os habitantes dessa bola voadora fizeram nos últimos anos e parece que estamos completamente divididos na busca por um mundo melhor, como um cabo de guerra de 6 bilhões de cordas.

Um certo esvaziamento da minha esperança, em muitos dias, é a razão pela qual estou escrevendo esse texto. Veja bem, não quero abordar as brigas do momento e nem fazer qualquer juízo de valor sobre quais opiniões estão mais ou menos certas.

Diferentemente disso, quero propor uma ótica mais simples: olhemos para trás. Quero lembrar que já progredimos muito e que muito provavelmente iremos progredir ainda mais.

O mundo melhorou muito

Essa é uma reflexão que gosto de fazer. De fato, o mundo hoje é muito melhor do que há 200, 500 ou 1000 anos. E tudo o que evoluiu, na velocidade em que o fez, é impressionante. Entramos em um mercado e estamos cercados dos mais diversos produtos para satisfazer nossas necessidades. Vivemos em casas de concreto e madeira, não em tocas. O mundo produz comida em abundância. Temos sistemas financeiros sólidos e moedas que nos permitem trocar o fruto de nosso trabalho pelos mais diversos produtos, sem depender de escambo. Podemos usufruir de remédios para doenças que anteriormente matavam milhares de pessoas ao redor do mundo. Enfim, o progresso feito até aqui é admirável e, infelizmente, muitas vezes esquecido por quem vive em 2020.

Imediatamente após ler isso, muitas pessoas irão se questionar: pois bem, o mundo até pode ter melhorado, mas para todos? Crianças ainda passam fome, famílias ainda não tem acesso a água potável, o mundo é cheio de problemas!

É verdade. O mundo tem muitos problemas. Mas o progresso feito até então é inegável. Em 1800 a expectativa média de vida no mundo era de 29 anos. Hoje, a menor expectativa de vida do mundo é maior que a da Europa em meados de 1890. Outro dado impressionante é o do PIB mundial:

O gráfico fala por si.

Esse é um exercício fundamental para restaurar a esperança e acreditar no progresso. Mas não só isso, é um exercício de agradecimento. Agradeça todos os dias por ter nascido em 1995, onde quer que seja, pois você certamente está em melhores condições que qualquer cidadão médio estava há 150 anos.

Nossos problemas parecem maiores pois somos atores do presente, enquanto somente podemos ser observadores do passado

Estamos em 2020 e temos uma pandemia, um conflito estressante entre as duas nações mais poderosas do mundo, economias entrando em colapso, líderes mundiais que são claramente inaptos e um nível de polarização quase que insuportável em diversos assuntos. Parece que a alegria acabou. Não tem mais carnaval, não tem mais Réveillon. Não tem mais churrasco de aniversário com 40 pessoas. Nossos opositores foram trazidos do inferno e somos os últimos anjos a tocar a terra.

Porém, lembre-se: esse mundo já passou pela peste negra, as economias se recuperaram da grande depressão de 1929, um continente inteiro foi reconstruído após o final da segunda guerra em 1945 e muitas pessoas achavam que a Rússia iria explodir os EUA — ou ao contrário — durante a crise dos mísseis de Cuba, o que não aconteceu.

Temos o sentimento de estarmos passando pela pior situação justamente pelo fato de estarmos passando por ela. Tenho certeza que se você dissesse para um soldado americano saindo de um bote na praia da Normandia em 1945, prestes a desviar de 50 balas de alto calibre até chegar na praia, sem nenhuma garantia de sobrevivência após isso, que o problemão em 2020 seria usar uma máscara sempre que sair de casa e evitar aglomerações ele daria risada e ficaria feliz pelos seus netos.

Para os pessimistas, trago uma boa notícia: rendimentos do passado não significam lucros certos no futuro e, por isso, até onde sabemos, todo o nosso progresso poderia estar a beira do fim em 2020. Ou em 2035. Ou a qualquer momento. A final, alguém tem mesmo certeza que não existe alguma outra civilização prestes a nos atacar?

Para os otimistas, como eu, vos digo: não é impossível, mas é altamente improvável.

O pós pandemia será o fim do mundo como o conhecemos. As nações terão que se adaptar e se preparar para futuras adversidades, sejam elas climáticas ou epidêmicas. Economias não voltarão ao “normal” e os legisladores terão que trabalhar para encontrar soluções e caminhos que guiem a população mundial à um estado de segurança cada vez mais sólido. As coisas serão profundamente diferentes. Mas será isso: a conclusão de um ciclo para o início de outro. Nem o pior problema já enfrentado pela humanidade, nem o último a ser. Apenas mais um.

E todo esse progresso, de onde ele veio?

Sobre isso há pessoas capacitadas pesquisando e desenvolvendo teorias. Algumas abordam a relação entre materiais e mão de obra, outras abordam localização e geopolítica. O progresso é um campo amplo e difícil de ser estudado. Não fosse assim, não teríamos tantas divergências hoje sobre como continuar progredindo. O melhor site sobre “as raízes do progresso” é esse: https://rootsofprogress.org

Todavia, há coisas que certamente não trouxeram progresso às nações. E sobre isso há também pesquisas bem interessantes e muitas vezes controversas. Um exemplo é um artigo que associa protestos violentos à efeitos contrários aos que motivaram as manifestações, concluindo basicamente que se você deseja mudança, talvez não seja a melhor ideia do mundo quebrar lojas e saquear mercados enquanto as reivindica.

Politicamente, há também aspectos desejáveis ao progresso: alternância e distribuição de poder, pluralidade de ideias e liberdade de expressão, fortes instituições (vide Why Nations Fail, de Daron Acemoglu), entre outros. O debate sobre isso deve ser promovido. Mas claro, o debate educado, respeitoso e ponderado. Promoção do debate não é desejar silenciar seus opositores.

Como continuar progredindo?

Essa pergunta é difícil. Como dito anteriormente, aumentar a velocidade na qual progredimos e manter o que já conquistamos são questões para as quais muitas pessoas tem respostas diferentes. Com isso em mente, não espere que alguém descubra a semente do progresso amanhã e saia plantando-a pelo mundo afora no outro dia.

Mas tenha paciência. Se promovermos a diversidade, no longo prazo, nos aproximaremos mais das sementes do progresso. Assim como a busca pela versão ideal de nós mesmos, essa corrida jamais terá um fim. Iremos evoluir e, a medida que evoluímos, teremos novas necessidades e novos desafios, os quais irão demandar melhorias em diferentes ramos.

Se queremos progredir mais e termos ondas mais suaves de “retardamento” no futuro próximo, precisaremos dominar essas tecnologias de informação das quais hoje, apesar de termos inventado-as, somos reféns. Precisaremos também de uma grande “guinada” ao centro, à moderação, para que os extremos deixem de dominar o debate público e possamos colocar um fim nesse sentimento de necessidade de revoluções constantes expressado por eles, o que não é bom para a democracia ou para as instituições. E, para que seja possível fazer tudo isso, precisaremos de temperança e empatia.

--

--

Bruno Sulzbach
Bruno Sulzbach

Written by Bruno Sulzbach

I will write opinions and reflections about politics, economics, and philosophy. PTBR & ENG.

No responses yet